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Um plenário lotado para Mãe Carmen: líder religiosa recebe Comenda Maria Quitéria

Um plenário repleto de trajes brancos e cantos de alegria: foi assim a cerimônia de entrega da Comenda Maria Quitéria a Mãe Carmen, ialorixá do Terreiro do Gantois, na noite de segunda-feira (29) . Mãe Carmen, de 95 anos, lidera o Terreiro há 21. 

Entre os presentes, estavam a vereadora Marta Rodrigues, proponente da Comenda a Mãe Carmen, o presidente da Fundação Gregório de Matos, Fernando Guerreiro, representando o prefeito Bruno Reis, além de Ângela Guimarães, Secretária de Promoção da Igualdade Racial, os padres Edson Menezes e Lázaro Muniz, a ialorixá Mãe Márcia de Ogum e a cantora Daniela Mercury. 

Para Mãe Carmen, ter seus ensinamentos alcançando pessoas fora do Gantois e registrados para as próximas gerações é uma sensação indescritível. “Só dá para sentir. O coração incha, a gente fica nas nuvens. A gente sabe que tudo isso acontece, mas quando é com a gente, só ficamos só agradecidos. Com 95 anos, receber uma homenagem dessas!”, disse.

A entrega do título aconteceu na Câmara Municipal de Salvador. Na ocasião, também foi lançado o livro de memórias e histórias de Mãe Carmen, Awon Ona Jagun.  O livro foi escrito por quatro iniciados no Gantois: Tanira Fontoura, Tiago Coutinho, José Ricardo Lemos e Rubens Caldas. Com design de Breno Loeser, o livro contou com consultoria religiosa de Iyá Kekeré Angela Ferreira e Iyá Dagan Neli Cristina Oliveira e participação do professor Adinelson Akambi Odé, consultor linguístico, que faz a tradução de parte da obra para o iorubá.

Tiago Coutinho, um dos autores, vê a publicação como um ‘ebó literário’, uma oportunidade de ampliar o alcance das histórias de Mãe Carmen, que eram transmitidas oralmente para os membros do Gantois. “O livro surge com o objetivo de deixar registrado de uma outra perspectiva, para além da escuta, tantas narrativas que minha mãe Carmen tem feito ao longo da sua trajetória de vida. Por isso, a gente considera que o livro é um grande ebó literário. É uma grande oferenda à sociedade como um todo.”, disse.

Para Adinelson Akambi, o contato com o iorubá é essencial para entender o papel do candomblé na preservação da ancestralidade. “O candomblé sempre foi entendido apenas como um lugar religioso, mas os terreiros sempre foram o lugar da preservação da língua, da literatura e da cultura. Então, ter um livro bilíngue, em português e iorubá, é afirmar a importância desse legado cultural linguístico, literário e cultural, que está preservado nos terreiros desde sempre”, afirmou o professor.

ana lúcia
Representantes de várias religiões foram saudar Mãe Carmen (Foto: Ana Lúcia Albuquerque)

Mãe Carmen de Oxalá, nascida Carmen Oliveira da Silva, é funcionária aposentada do Tribunal de Contas do Estado. Iniciada aos sete anos de idade, a religiosa é descrita pelos admiradores como uma líder nata, de pulso firme, mas sempre pronta para acolher. Além disso, é um exemplo para muitos de força e resistência. “A história é de mãe Carmem, mas é uma história que fala do poder negro e feminino, é uma história que fala desse legado ancestral, de todas as mulheres à frente do seu tempo, que empunharam a bandeira do candomblé e fizeram com que essa religião ganhasse visibilidade”, destacou Tiago Coutinho.

No evento , a fé uniu todas as religiões. Com a presença de líderes religiosos como a ialorixá Mãe Márcia de Ogum e os padres Edson Menezes e Lázaro Muniz, os axés e améns se misturavam com harmonia no salão. 

Durante seu discurso, a historiadora Tanira Fontoura, uma das autoras do livro, ressaltou a capacidade unificadora da ialorixá. “A gente vê esta mesa aqui estendida com todos esses líderes religiosos de diversas dimensões, a gente mostra a diversidade, a grandeza e a leveza que é Mãe Carmen diante de momentos como esse”, disse.

O padre Lázaro, da Igreja do Rosário dos Pretos, falou sobre sua relação com a líder religiosa. “Todas as vezes que pude estar no terreiro do Gantois, tive a certeza de ter sido recebido e acolhido como sacerdote da igreja católica sem nenhuma dificuldade na relação”, declarou.

Com os conflitos com a Igreja ganhando visibilidade, o padre disse estar tranquilo em relação à repercussão do caso. "Eu tenho sempre dito que Salvador me conhece. Aqueles que estão contra mim não me conhecem, não sabem do meu trabalho, apesar de pertencerem à devoção do Senhor do Bonfim. Tenho também esclarecido que não é um problema da irmandade como um todo, é de um pequeno grupo que quer atrapalhar o meu trabalho. Mas Deus é justo, e aquilo que eu venho fazendo todos sabem. Eu tenho a certeza de que a verdade prevalecerá", ressaltou o Muniz, que recebeu palavras de apoio dos presentes ao ser mencionado durante a cerimônia.

*Com a orientação da subchefe de reportagem Monique Lôbo