A escalada da guerra entre Hamas e Israel, no Oriente Médio, não interessa a nenhuma nação, e o Ocidente já percebeu que a solução de dois estados para apaziguar as questões entre Israel e Palestina é imperativa e não pode mais ser adiada. Porém, o enfrentamento ao Hamas parece se impor às negociações de paz, o que leva à conclusão de que, lamentavelmente, “muito sangue ainda vai rolar” até que a situação chegue a um desfecho.
“O Ocidente vai perceber – já percebeu – que a necessidade da solução de dois estados não pode mais ser adiada. E o Brasil entra nessa história muito fortemente. Lula já percebeu isso e está trabalhando nesse sentido. O interesse na manutenção do conflito, até agora, é basicamente pela noção de que o prejuízo era menor que o lucro. Mas isso mudou.”
A análise é de Michel Gherman, professor do departamento de sociologia e do Núcleo Interdisciplinar de Estudos Judaicos e do programa de Pós-Graduação em História Social (PPGHIS) da UFRJ. Gherman foi entrevistado pelo jornalista Luis Nassif na noite de terça (24), para o programa TVGGN 20 Horas, que é transmitido diariamente no canal do GGN no Youtube [assista abaixo].
Segundo Gherman, não há possibilidade de resolução do conflito no Oriente Médio enquanto não houver demonstração de força pelo Hamas, pois o protagonismo do grupo antissemita, além de não trazer solução para a questão palestina, também ameaça a Europa e outras regiões do mundo com o fantasma do terrorismo, que pode se alastrar através de outros grupos extremistas.
“O que o Hamas produziu não tem nada a ver com a questão palestina. Tem a ver com a perspectiva teocrática, fundamentalista, racista. Hamas é um grupo antissemita desde sua origem. A manutenção do Hamas como referência pelos governos de extrema-direita israelenses quer mostrar, inclusive, uma forma de não resolver a questão palestina”, disse.
Gherman analisou que o massacre de 7 de Outubro – quando o Hamas atacou Israel e assassinou brutalmente 1.400 pessoas e sequestrou outras 220 – colocou o Hamas no mesmo patamar em que está o ISIS em termos de barbárie.
Não à toa, nesta semana, o presidente francês, Emmanuel Macron, viajou ao Oriente Médio e afirmou que os países que combateram o ISIS no passado agora devem se reunir novamente para derrotar o terrorismo do Hamas com “ações direcionadas” ao grupo. Em certo nível, Macron criticou a resposta militar de Israel, que está bombardeando Gaza indiscriminadamente, matando mais de 5 mil civis palestinos desde o ataque do Hamas.
Na visão de Gherman, Macron representou a noção europeia de que é preciso interditar o terrorismo, porque “o que aconteceu com o Hamas [em Israel] pode se espalhar para a Europa, e um segundo ISIS é tudo que a Europa não precisa hoje”. Ao mesmo tempo, a Europa não quer escalar o conflito armado porque isso vai desestabilizar o bloco e “fortalecer as perspectivas chinesas de hegemonia no mundo, e ninguém tem interesse nisso agora.”
O fim da dança macabra?
Para Gherman, a tendência com a guerra em curso, eventualmente, é que o Hamas saia enfraquecido, assim como o próprio grupo de Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro, de ultradireita, de Israel, porque “tudo que produziu, produziu errado. A ideia de patriotismo, de defesa interna, de manutenção de um país que não negocia com os palestinos. Tudo isso foi para o vinagre, provou-se falácia”, disse.
“Estamos numa situação terrível, trágica, com milhares de mortos. Ainda vamos ter muito sangue correndo nesta história. E estamos no pior momento para falar o que vou falar: tudo isso mostra a falência, o colapso de um modelo de diálogo, de uma dança macabra entre o fundamentalismo [islâmico] e a extrema-direita [israelense]. Em algum sentido, vamos ter que pensar numa solução, porque o Hamas vai desaparecer no horizonte – pode demorar – e o Netanyahu também vai desaparecer. O que vai sobrar é espaço político para ocupar. E para isso, vai ter que ter negociação que passe, necessariamente, pelo estado palestino, ao lado de Israel, com paz, prosperidade e segurança como modelo final“, defendeu.
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