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Pacientes reclamam do atendimento no Ambulatório Trans

Gisela Fernandes aguarda a terapia para redesignação de gênero - (crédito: Gisela da Silva Fernandes, Riacho Fundo II, 48 anos)

Gisela Fernandes aguarda a terapia para redesignação de gênero - (crédito: Gisela da Silva Fernandes, Riacho Fundo II, 48 anos)

Inaugurado em agosto de 2017, o Ambulatório de Diversidade de Gênero, conhecido também como Ambulatório Trans, ainda não é capaz de responder plenamente as demandas recebidas. A unidade tornou-se alvo de reclamações quanto a dificuldade de acesso, lentidão de atendimentos e deficiência na comunicação. Localizado no Hospital Dia da Asa Sul, o espaço atende 580 pessoas e existem mais 600 na lista de espera aguardando o início do acompanhamento, segundo dados da Secretaria de Saúde (SES-DF).

Nos consultórios, os relatos de quem conseguiu acesso ao ambulatório variam. Para o estudante de música da Universidade de Brasília (UnB) Liam Godoi, de 19 anos, a dificuldade de iniciar o atendimento se agravou devido a pandemia de covid-19. O jovem recebe tratamento psicológico e ginecológico e se inscreveu para o grupo de espera para admissão no ambulatório em 2021, mas só ingressou em março deste ano. "Quando chegamos no grupo de acolhimento, algumas pessoas falaram que tinham feito a inscrição há três anos, enquanto outras falaram que foi feita há meses. Agora, acho que estão chamando mais rápido", avalia.

Após conseguir o atendimento, Liam percebeu a diferença em ser paciente nesse espaço. "Passei por psicólogos antes que não entendiam muito bem essa questão de eu ser trans. Às vezes, erravam meus pronomes", relembra. O estudante argumenta que, no ambulatório, há uma melhor compreensão e mais sensibilidade quanto às experiências de pessoas trans.

Demora

O Ambulatório Trans foi tema de audiência pública em fevereiro deste ano na Câmara Legislativa, mas, desde então, a situação permanece a mesma. Na ocasião, foram debatidas estratégias para garantir os direitos da população transgênero e travesti. O encontro, realizado a pedido do deputado distrital Fábio Felix (Psol), contou com representantes de associações voltadas aos direitos LGBTQIA e de parlamentares. Na ocasião, Fábio Felix se comprometeu a apresentar emenda para custear à Secretaria de Saúde os hormônios necessários para o processo de transição de gênero.

Gisela Fernandes, 48, aguarda a terapia hormonal para redesignação de gênero. Ela procurou o Correio para protestar contra os serviços do ambulatório, que enfrenta falta de profissionais e até de equipamentos médicos, além de demorar no atendimento. Ela cobra os compromissos assumidos na audiência pública quanto aos recursos para o ambulatório e a implementação de políticas de saúde voltadas à população trans no cronograma da Secretaria de Saúde.

Da mesma forma, Kai Fadel Helgert, 19, depara-se com dificuldades. De gênero não binário, Kai buscou participar de sessões de terapia em grupo no ambulatório, mas, não obteve retorno de sua solicitação. "A equipe pediu para eu mandar a minha questão por e-mail, porém, nunca houve retorno e nem orientação", lamenta. Ela também procurou ajuda para fazer a retificação de nome social — processo de atualização do nome e gênero em documentos oficiais —, mas não obteve sucesso. "Tentei auxílio para isso nos últimos dois anos e nunca tinha alguém para me atender", reclama.

Risco

Lucimara Pinto da Rocha, 40, também é paciente do local. Ela começou o tratamento hormonal na unidade há mais de dois anos, encaminhada por médicos do próprio Hospital Dia. Lucimara acredita que isso facilitou sua admissão no ambulatório. Antes de receber acompanhamento profissional, a cozinheira se automedicou e alerta para os riscos da prática. "Fazer esse tipo de coisa sem conhecimento é muito arriscado", reflete.

Segundo o doutor em endocrinologia clínica pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Flávio A. Cadegiani, a garantia da saúde de pacientes em terapia hormonal depende de um acompanhamento adequado, regular, e multidisciplinar. "Quando falamos de saúde, não se trata apenas de não desenvolver doenças, mas sim garantir o bem-estar físico, psicológico, social e em múltiplas outras dimensões", argumenta.

O especialista ressalta que ambulatórios não servem como "mero local de adequação hormonal — são ambientes onde pessoas do espectro trans devem ser acolhidas e tratadas a partir de uma abordagem, acima de tudo, não ideológica, onde o que importa são as pessoas".

Providências

A assessoria do deputado Fábio Felix informou que o encaminhamento de recursos depende das normativas estabelecidas pelo Protocolo Hormonal que, apesar de pronto, ainda não foi aprovado pela Secretaria de Saúde. "A SES está protelando sem haver nenhuma justificativa plausível diante das necessidades de centenas de pessoas trans atendidas pelo ambulatório", afirma.

Segundo a SES, o documento ainda não foi concluído. "Neste momento, o Ambulatório de Diversidade de Gênero está na construção do Protocolo de Hormonização (PCDT) para ser utilizado em toda Rede SES. O ambulatório não faz a retificação de nome, mas dispõe de "serviço social para direcionar os usuários". A pasta também frisa que não fornece hormônios e nem regulação para cirurgias do processo transexualizador.

De acordo com órgão, o ambulatório conta com uma equipe multiprofissional que atua na "assistência à saúde integral da pessoa transexual, travesti e não-binária. De acordo com o órgão, está em processo de construção a Linha de Cuidado de Atenção à Saúde às Pessoas LGBTQIA . O objetivo é "alinhar o fluxo dos usuários na rede de saúde para uma atenção humanizada e qualificada a essa população".

*Estagiário sob supervisão de Malcia Afonso

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