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Olhares de Lisboa: Rondas

Por: Filinto Elísio

Ronda noturna pelo bairro, ainda por explorar, agora que se está em casa nova. Momento de reflexão, de conversa e de giro, em que te recito um poema de Osvaldo Alcântara e sorris do rasgo “dimensão desmesurada do mundo”, que nos diz muito, quase tudo. O mais: fragas e saudades, deambulações e mãos dadas, marinhagens e politicagens. Assim…

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Avançou-se muito desde a independência, mas não se superou a pobreza, a desigualdade e a fragilidade. Continuam estas estruturais. Atingiu-se o patamar de País de Desenvolvimento Médio, mas de rendimento baixo, ainda com insuficiente transformação para garantir o “salto qualitativo”. O país precisa crescer mais. Crescer melhor, em verdade.

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Consensos políticos (nas áreas económicas e sociais, sobretudo) seriam, quero crer, as decisões avisadas (por que históricas e estratégicas) para recentrá-lo rumo ao desenvolvimento sustentável. Neste momento, a não correção da rota, preocupa.

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Avolumam-se sinais de uma tempestade perfeita. Demasiados imponderáveis, alguns muito confusos, tendem a descaraterizar o jogo democrático e a prever sorte aziaga à nossa vontade do progresso. Há nuvens dúbias no horizonte. Como evitá-las?

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A risco de simplificação, do que se supõe complexo, o sensato é não adiar a discussão sobre o futuro agora e admitir que a solução possa passar “pela incorporação no veleiro em que todos navegamos”, como, poeticamente, vaticinara Osvaldo Alcântara. Ronda feita (e lua a testemunhá-la). Que as crónicas de Lisboa são também de marinhagens e politicagens. Enfim…

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O delírio salta à vista. Histericamente. E a questão não se resume à nossa soberania e à qualidade da nossa democracia, mas exige para a equação a variável constituinte do sujeito, que é, para além da liberdade, a qualidade de vida…das pessoas.

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A taxa da pobreza agravou-se para 31,7% e a da extrema pobreza para 13,1%. Fala-se de 30 mil pessoas em situação de insegurança alimentar e 107 mil sob pressão alimentar. E a fome, ainda incessante no nosso inconsciente coletivo, importa exorcizá-lo sempre. Em verdade, sublimá-lo definitivamente. Quo vadis?

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Ou bem fazemos, agora antes que tarde, a tal mudança de rota, no retorno à sintonia da Agenda para o Desenvolvimento Sustentável de 2030 ou enterramos a cabeça na areia, ensimesmados no ato indecoroso de negação à realidade.

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À classe política o dever de realizar o pacto social alargado, que se configure em efetiva criação da riqueza, redução da pobreza e ampliação/partilha da prosperidade, com aposta forte no emprego, educação e ambiente.

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O papel civilizador da política contra esse resvalar do processo histórico no histérico, já que nada mais trágico, burlesco e absurdo que a miséria humana. A propósito, recomendo a quem se digne (re)veja o filme “Feios, Porcos e Maus”, de Ettore Scola. Pode ajudar a aquietar esse delírio. Pode?

Publicada na edição semanal do jornal A NAÇÃO, nº 791, de 27 de Outubro de 2022

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